10/02/2022
Não é sobre ser bonzinho, mas sobre responder às exigências dos consumidores e, bem, do planeta. É o que acredita Fernando Bertolucci, diretor executivo de Tecnologia e Inovação da Suzano, uma das maiores empresas de papel e celulose do mundo.
Na visão do executivo, sustentabilidade e responsabilidade social já são fatores capazes de fazer um negócio vingar ou afundar. “Enfrentamos desafios que transcendem as empresas, vários são globais. Por isso, a agenda ESG se tornou imperativa. Não se trata de ter lucro “ou” ser sustentável. É tempo do “e” – as empresas vencedoras terão que praticar a ambidestria, combinando excelência nos negócios e no cumprimento da agenda ESG”, afirma.
Bertolucci aposta na inovação como o principal mecanismo para desenvolver produtos e serviços não só mais sustentáveis, mas também capazes de resolver problemas contemporâneos. Ele conversou com a Agência de Notícias da Indústria sobre inovação, negócios e sustentabilidade, uma prévia do que ele levará para discussão no 9º Congresso Brasileiro de Inovação da Indústria, em março. Confira a íntegra da entrevista.
AGÊNCIA DE NOTÍCIAS DA INDÚSTRIA – Quais são os principais desafios para inovar no Brasil?
FERNANDO BERTOLUCCI – A inovação é uma das maiores alavancas para a geração de vantagens competitivas, para países e empresas. Infelizmente, os investimentos para a inovação no Brasil, em relação ao PIB, ainda estão distantes das grandes potências mundiais. Os ambientes político e econômico aumentam significativamente os riscos de investimentos de longo prazo no nosso país e diminuem o interesse dos investidores, que acabam optando por destinar recursos a outros países. Isso reduz a nossa capacidade de inovar e, consequentemente, a nossa competitividade global.
Aliado a este fato, a infraestrutura para a inovação no Brasil ainda está aquém das nossas necessidades. Assim, por vezes precisamos buscar parcerias internacionais e realizar projetos fora do Brasil, simplesmente por não existir uma política de longo prazo para fomento de ICTs e empresas dedicadas à inovação.
Uma outra questão é a formação insuficiente de mão de obra especializada, em muitos setores chaves para a nossa economia. A inovação transformacional precisa de políticas de longo prazo, infraestrutura adequada e pessoal qualificado. Quando um ou mais elos não existem ou são deficitários, todo a cadeia é prejudicada; e assim seguimos perdendo oportunidades para transformar o Brasil num país melhor, mais rico e socialmente mais justo.
AGÊNCIA DE NOTÍCIAS DA INDÚSTRIA – Sustentabilidade entrou de vez na pauta das empresas. O que inovação tem a ver com isso?
FERNANDO BERTOLUCCI – Na minha opinião, a inovação é uma das ferramentas mais eficazes e inteligentes para endereçar os problemas do nosso planeta. Na Suzano, adotamos o conceito de inovabilidade – a inovação a serviço da sustentabilidade – para nortear as nossas iniciativas. Sabemos da nossa responsabilidade e queremos impactar positivamente a sociedade. Um exemplo disso é o nosso compromisso de, até 2030, oferecer 10 milhões de toneladas de produtos de origem renovável, que possam substituir produtos de origem fóssil, contribuindo de forma significativa para o endereçamento de um dos maiores problemas atuais, que é a poluição ambiental. Todavia, estas soluções não estão prontas, os produtos estão sendo desenvolvidos. É um claro exemplo de como a inovação e a sustentabilidade podem andar juntas.
AGÊNCIA DE NOTÍCIAS DA INDÚSTRIA – Na sua opinião, que tipos de instrumentos podem ser usados, em termos de políticas públicas, para incentivar a sustentabilidade na produção brasileira?
FERNANDO BERTOLUCCI – Temos visto iniciativas materializadas em algumas políticas públicas, como alguns editais em diferentes níveis de abrangência (nacional, regional e local), que ajudam a organizar o ecossistema de inovação para a temática da sustentabilidade. Instrumentos com recursos oriundos do FNDCT, por exemplo, e outros como editais fomentados pela Finep, pelas FAPs, BNDES, EMBRAPII, SEBRAE, SENAI, entre outros, na linha da sustentabilidade (ou inovabilidade), também estão se tornando mais comuns.
Outro bom exemplo é Lei do Bem, que tem demonstrado o seu valor, porém ainda é menos impactante do que poderia ser, em função da sua restrição de uso apenas nas condições de ‘lucro fiscal’. Ou seja, temos vários exemplos e iniciativas de fomento que deram e/ou estão dando certo, porém a inovação no Brasil precisa ser encarada como uma política de Estado com melhor definição de prioridades, considerando as nossas vocações e ambições, com garantia de apoio e incentivo de médio e longo prazos.
Muitos dizem que em países desenvolvidos a iniciativa privada investe muito mais que o Estado em inovação. Isso está correto! Todavia, é importante entender que nem sempre foi assim. O Estado tem um papel relevante de impulsionar o processo de inovação, além de trabalhar para a criação de um ambiente de negócios mais previsível, com visão de longo prazo.
AGÊNCIA DE NOTÍCIAS DA INDÚSTRIA – Muito se fala em estratégia ESG. A indústria brasileira está preparada para implantação dessa estratégia? Teremos uma indústria mais sustentável nos próximos anos?
FERNANDO BERTOLUCCI – ESG não é novo. Há quase duas décadas temos este conceito presente na agenda das grandes companhias, mas reconheço que o tema tem se intensificado nos últimos anos. A grande novidade é que aos poucos estamos deixando de ver uma separação entre a estratégia de negócios e a estratégia que contempla os temas ESG. Felizmente, a agenda ESG está passando a fazer parte da própria estratégia das empresas. Não se trata de ser “bonzinho”; trata-se da construção de empresas vencedoras, capazes de incluir, nos seus negócios, as exigências da sociedade contemporânea. Esse é um ciclo muito positivo, onde todos ganham, e a indústria brasileira precisará jogar esse jogo, pois ele veio para ficar. A boa notícia é que já conseguimos ver vários bons exemplos.
Para sustentar o meu ponto cito o caso da Suzano, que tem buscado evoluir as suas práticas e compromissos com todos os seus stakeholders (não apenas com os acionistas e investidores). Em função disso, assumimos os nossos “compromissos com a vida”, metas que terão que ser atingidas até 2030. Vamos aumentar a disponibilidade hídrica em 100% das nossas bacias hidrográficas críticas, bem como reduzir em 15% a água captada nas operações industriais. Já somos carbono neutro e queremos ir mais longe, removendo 40 milhões de toneladas de carbono da atmosfera (neste caso, até 2025). Mais recentemente, em junho de 2021, anunciamos ao mercado uma meta relacionada à conservação e biodiversidade.
Nos comprometemos a conectar meio milhão de hectares de áreas prioritárias para a preservação nos biomas Cerrado, Mata Atlântica e Amazônia – o que equivale a quatro vezes a cidade do Rio de Janeiro. Sabemos que enfrentamos desafios que transcendem as empresas, vários são globais, inclusive. Por isso a agenda ESG se tornou imperativa. Não se trata de ter lucro “ou” ser sustentável. É tempo do “e” – as empresas vencedoras terão que praticar a ambidestria, combinando excelência nos negócios e no cumprimento da agenda ESG.
AGÊNCIA DE NOTÍCIAS DA INDÚSTRIA – A Suzano aposta cada vez mais na tecnologia para manter a produtividade de maneira sustentável. A empresa investiu num programa de melhoramento genético para clonagem de árvores no futuro. Por que clonar árvores? Quais os ganhos para indústria e meio ambiente?
FERNANDO BERTOLUCCI – O processo de clonagem, ou propagação vegetativa, é uma habilidade evolutiva que diversos vegetais utilizam para se multiplicar. Como exemplos de espécies que são propagadas vegetativamente, ou por clones, podemos citar a cana-de-açúcar, a mandioca, o abacaxi, a batata, entre outros vegetais, incluindo o eucalipto.
No melhoramento genético identificamos as árvores superiores (maior produtividade, melhor qualidade da madeira, resilientes às condições climáticas e tolerantes às principais pragas e doenças) e as multiplicamos em larga escala por meio do processo de clonagem, visando o plantio de florestas cada vez melhores. Com isso, asseguramos aumentos contínuos de produtividade e de qualidade da nossa madeira, viabilizando uma maior produção com menor uso de recursos naturais.
Além de que, com o uso de clones tolerantes às principais pragas e doenças, reduzimos a necessidade de defensivos químicos nos nossos plantios florestais. Somos pioneiros na adoção em larga escala da clonagem para a produção de mudas de eucaliptos, trabalho desenvolvido nas décadas de 1970-80 e hoje difundido em toda a indústria florestal.
Fonte: CNI
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